domingo, 18 de março de 2007

Chuva plural

Chove uma chuva intensa. Como se soubesse que você gosta de estar descalça, a acariciar o chão com a sola dos pés. Como se quisesse que você corresse sem medo e sem freio, sem receio e sem roupa.
Chove uma chuva abundante. Ela lembra teu sorriso aberto e hospitaleiro, de quem gosta de sorrir ao coração. Farta as ruas e vielas, enche-se de concreto e restos de vida esquecida pelo chão.
Chove uma chuva transbordante. Assim como eu já te vi transbordar e voltar a transbordar. Voltar a derramar tua alma em meu peito em sons e respiros. Verter-te dentro dos meus olhos e acenando.
Chove uma chuva selvagem. Como se fora uma fera a se lançar na noite. Uma forma de vida que vai e vem. Mutante, mutável, muda e molhada. Barulhenta e inconformada a questionar se há justiça no mundo.
Chove uma chuva saudosa. Como a batizar em meu coração o teu nome líquido. Tatuar eu meu peito teu sobrenome sólido. Transformar o ar que respiras em moléculas de amor. Te amar num átomo. Chove uma chuva plural. Uma chuva de letras e significados escondidos na distância entre nós dois. Uma chuva de beijos secos de saudade, impermeáveis de paixão. Chuva que chega e toma conta. Toca um tímpano de trovão. Banha e ensina esperar.